sábado, 30 de dezembro de 2006

Circo

Na época em que a oferta de emoções era infinitamente mais limitada, a gente assitia ao circo. Em Barcelona, era tradição aproveitar a tarde do 26 de dezembro (feriado na Catalunha), após o segundo almoço familiar consecutivo, apesar que as diferentes companhias de circo ficassem algumas semanas na cidade.

Circ Raluy

A última vez que entrei no circo foi seis anos atrás. Junto com Jordi Nadal e nossas crianças respeitivas, assistimos a sessão matinal do circo Raluy, que por regra geral ergue suas barracas e coloca suas belas carruagens no Port Vell (porto antigo) de Barcelona, frente ao aquário (com seu corridor submergido na piscina dos presumívelmente voraces tubarões) e o cinema IMAX (com vertigens visuais envolventes e em tres dimensões). Ou seja, emoções em letra maiúscula, para saciar a fome que parece ter a sociedade veloz e epidérmica do século XXI, aquela que rende culto ao descartável.

O circo e seu redor -com freqüência cobertos pela pátina romántica que nós damos aos mundinhos meio bohemios, meio desconhecidos, com pouca relação com a realidade- tem sido argumento de filmes, cenário de romances e tema de pinturas famosas. Uma exposição no museu Picasso de Barcelona permite fazer um percurso pelas conhecidas referências circenses de Picasso até o próximo fevereiro.

No meu monte (já muito alto) de pendentes tenho Mr Vertigo de Paul Auster, a história de um menino orfão e seu mestre Yehudi; o mestre ensina ele a levitar e a dupla comença a apresentarse em todos os circos dos Estados Unidos. Umas frases pegadas sem muito buscar:

No fundo, acho que não é preciso nenhum talento especial para que uma pessoa se levante do chão e fique suspesa no ar. Todos levamos isso no interior -homens, mulheres e crianças-, e com suficiente esforço e concentração, todo ser humano é capaz de duplicar ás façanhas que eu fiz quando era Walter o Menino Prodígio. Você tem que aprender a deixar de ser você mesmo. Esse é o ponto de partida, e o resto sai daí. Você tem que se deixar evaporar. Deixar que seus músculos se relaxem, respirar até que você note que sua alma sai de você, e nesse momento, fechar os olhos. Assim é como se faz.

A questião de fundo é, como tantas vezes, saber onde está a fronteira (e quem a delimita). As coisas que são circo e as coisas que não são circo. Da mesma forma que aquele doutor Simão Bacamarte saido da ótima caneta de Machado de Assís que, no O alienista decide fundar uma casa de loucos, onde comença atrancafiar pessoas lúcidas.



O malabarista dançante, espetáculo circense-musical no barri Gòtic de Barcelona.

[Tradução do autor. Me desculpe os erros]

Links de interesse:
Circo Raluy
Museo Picasso - Exposición Picasso y el circo

Nenhum comentário: